28 de janeiro de 2014

A arte de bem especular

Janeiro está a chegar ao fim e já lá vão dois tiros no porta-aviões. Ola John foi, puxado por uma orelha, para o Hamburgo. E assim se perdeu uma das peças mais importantes do Benfica na recta final do ano passado. Não satisfeitos, lá foi também o desgraçado do sérvio. Matic, o «melhor médio defensivo do mundo», segundo Jorge Jesus. Chelsea dá e Chelsea tira. O dinheiro não é problema…pelo menos para os lados de Londres. Já em Lisboa a corneta apita de outra forma. E o regimento marcha com uma mão à frente e outra atrás.

Luís Filipe Vieira diria, neste momento, algo como «mas mais vale marchar do que morrer!». Tudo bem. Eu diria, contudo, que mais vale ter quem meter a marchar do que metê-los a marchar daqui para fora – perdoem as redundantes metáforas. Gastaste o que havia e o que não havia para gastar. Agora? Agora o nosso meio-campo, ainda que seja o melhor em Portugal, está ao abandono. A um nível tal que ver os últimos jogos disputados na Luz naquele relvado era como ver o (não) desenvolvimento da agricultura portuguesa no pós-Política Agrícola Comum. Um enorme batatal, mas batateiros e batatas nem vê-los. “Deixe lá, Sr. Ministro. A gente manda vir de Espanha. Ou de França”. “Mas não fica mais caro?”. “Fica”. “E não tem menos qualidade?”. “Claro”. “E não estamos a matar a nossa mecânica produtiva?”. “Sim”. “Vamos a isso então!”. Que bom é ser-se português. Tanto na política, como no futebol.

E de portugueses falemos. Mais precisamente de André Gomes. O jovem de 20 anos foi – e esta aqui não deixa de me fazer rir – “comprado” pelo empresário Jorge Mendes. O homem que também representa os célebres Cristiano Ronaldo e José Mourinho parece ter encontrado num dos futuros projectos benfiquistas…um futuro jogador para o futebol não-português. Mais precisamente para o futebol inglês. Gomes viu o seu nome associado ao Liverpool, este domingo, pelo jornal The Sunday Times. Mas já dizia Ricardo Araújo Pereira na interpretação de uma das suas maiores personagens: «Falam, falam, pá, e eu não os vejo a fazer nada! Fico chateado, com certeza que fico chateado, pá!». É que isto de “falar” em coisas é sempre interessante, mas é preciso saber fazer disso profissão. É preciso saber fazer disso arte. Aí, não há ninguém melhor do que os jornalistas. Do que a comunicação social. Mas mesmo esses têm falhas. Vejamos porquê.
“Eu já fui. E tu?” in zerozero.pt
A tal notícia que associa André Gomes ao Liverpool, e que todos os grandes desportivos nacionais usaram para encher papel hoje, explica que só há interesse no médio benfiquista porque Gerrard e Lucas estão no estaleiro. Ah, e como se não bastasse, quem ilustra o artigo é o André…mas o Almeida. Poético. O mais bonito é que ainda se fala num outro possível interesse, desta feita por parte do Manchester City. Agora pergunto eu: mas alguém se lembra que em Junho André Gomes estava referenciado pelo Chelsea? Quem é que acabou por ir para lá preencher o meio-campo? Pois.

Fica aqui a prova provada de que o Benfica tem a corda na garganta. De que a sarna é muita, mas as notas para a coçar já há muito que trocaram de mãos. De que o Benfica não tem problemas em especular para valorizar e meter os seus jogadores nas bocas do mundo. E que um empresário faz e fará sempre aquilo que um empresário tem de fazer: jogar com tudo o que o rodeia para fazer dinheiro. Para quê? Para fazer ainda mais dinheiro. Mas não tem mal. Não precisamos de André Gomes, de qualquer forma. Enzo, Fejsa e Amorim chegam e sobram. Se algum partir as duas pernas, Gaitán também dá para o meio. Em último caso espeta-se lá com Markovic (finalmente!). Com certeza que nenhum dos dois últimos será necessário para jogar nas alas até porque são muitas as opções que temos. Como Salvio, por exemplo. Ou Ola John, de quem falávamos há pouco. Acima de tudo, não queremos é dar cabo da carreira a um puto que até tem o que é preciso para vingar. Sim, vamos vendê-lo até dia 31 de Janeiro por mais de 15 milhões de euros – valor pago por Jorge Mendes. Senão, não tem mal. Fica para o final da época.

E se eu disser que nem agora, nem nessa altura? É a arte de bem especular. Ou não.

Artigo presente no sítio de desporto online

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