Quando a paixão impera, mas o coração já não bate
Primeiro, Fabrice Muamba. Depois, Piermario Morosini. Miklós Fehér, então, nunca nos saiu da memória. Mas não é só no futebol que se morre por amor à camisola. Ciclismo, basquetebol e voleibol são outras modalidades de risco. Mas até que ponto pode esse risco ainda existir na alta competição?
As bancadas à pinha. Um apoio ensurdecedor. Os ponteiros do relógio que não descansam. O suor que não deixa de escorrer. A bola de cá para lá e de lá para cá. Quando, de repente, tudo cessa. Um baque seco invade o ambiente. A bola perde-se. As lágrimas substituem o suor. E, sem que ninguém o fizesse prever, o coração pára. Foi assim em Pescara, com Morosini. Foi assim em Londres, com Muamba. Em Guimarães, com Fehér. O mesmo com Antonio Puerta, em Sevilha. O mesmo com Bruno Neves, no ciclismo. E com Paulo Pinto, no basquetebol.
No nosso país, a conjuntura actual é, ainda assim, «muito positiva». Quem o diz é Nuno Lousada, cardiologista especializado em Medicina Desportiva. A situação tem melhorado a olhos vistos, o que se comprova pela «quase inexistência de casos de morte súbita nos últimos anos». Mas o que é que provoca realmente este tipo de incidentes? «No que diz respeito aos atletas mais jovens é normalmente a miocardiopatia hipertrófica». Uma patologia na qual uma porção do miocárdio engrossa, o que consequentemente leva à fibrilação ventricular. E é a fibrilação ventricular que origina alterações no ritmo cardíaco, impedindo o sangue de chegar ao cérebro em tempo útil, causando morte cerebral.
«Nem sempre há explicação para tudo, porque nem tudo é a preto e branco na cardiologia». Actualmente responsável pelo Hospital de dia de Insuficiência Cardíaca, no Hospital Pulido Valente, o cardiologista explica que são ainda muitas as situações que a medicina actual não consegue prever ou solucionar: «É normal que uma morte destas se dê sem qualquer tipo de sintoma prévio. Chegamos mesmo a não conseguir encontrar qualquer tipo de doença na realização da autopsia».
Por ano, mais de 700 mil adultos na Europa morrem de doença cardiovascular, fazendo desta a primeira causa de morte no mundo Ocidental. São dados do INEM, que deixam o alerta. Mas o alerta não basta. No desporto, é necessário combater a «violência competitiva em que os atletas vivem submergidos» e o «poder que certas instituições têm, impedindo os verdadeiros profissionais da cardiologia de trabalhar», diz Nuno Lousada. Isso e contrariar os jogadores que insistem em «desafiar a sua própria condição física», optando por jogar, mesmo com indicações médicas em contrário. A morte de Bruno Baião, júnior do Benfica, é um exemplo.
Mas caminhamos para um cenário positivo. Em Portugal, os atletas federados são por lei obrigados a realizar exames gerais de avaliação médico-desportiva. São também cada vez mais as instituições desportivas que aderem ao Plano Nacional de Desfibrilhação Automática Externa (PNDAE). E há um acompanhamento dos desportistas por profissionais capazes de lidar com este tipo de incidentes cardíacos. Como diria Nuno Lousada, «o primeiro passo está dado...agora é continuar!».
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